terça-feira, 10 de junho de 2014

Convicções maternas e a cultura massiva da mãe perfeita

Há dias tenho pensado sobre isso, talvez seja simples perceber, ou não, mas me assola pensar em questões relacionadas a mistificação que existe em volta da maternidade e da necessidade de perfeição.

Participando de grupo maternos e fazendo minhas leituras por blogs e espaços que discutem a maternidade tenho sempre percebido uma demasiada necessidade de criar e programar uma maternidade perfeita, como se ela fosse possível.

Então fazendo um percurso comecei a fazer rápidas observações e é justamente sobre elas que se destina este post.

Aonde tudo começou? Fiz a leitura de duas publicações que me chocaram, uma delas de uma mãe que feliz conseguiu realizar o parto domiciliar e escreveu para uma mãe que não conseguiu basicamente chamando-a de fraca. E outra publicação em que uma mãe escreve que deu um chocolate ao filho de 2 anos e se arrependeu do dia em que decidiu compartilhar com as "amigas", que a julgaram como péssima pois introduziu o alimento "proibido" na vida de seu filho que deveria se alimentar somente com comidas saudáveis e porque não, orgânicas.

Começamos com a mais forte questão e discussão atual, o parto, criou-se uma necessidade de determinar que o parto para ser perfeito precisa ser o parto humanizado, preferencialmente domiciliar, não obstante a grávida que não atinge essa possibilidade é entendida como uma mãe que não atingiu o mais alto grau e feliz estágio de uma gravidez.

Entramos então no segundo ponto, a amamentação, uma mãe que não amamenta em livre demanda até os 3 anos não pode jamais se julgar mãe, não pode e não é, afinal criança saudável precisa amamentar até os 3 anos e não se fala mais nisso.

O terceiro ponto diz respeito a alimentação da criança, que deve ser essencialmente natural, saudável e orgânica, jamais crianças podem comer porcarias, mãe que dá porcaria não pode sequer ser considerada mãe.

Depois disso vem ainda a questão do estímulo, toda mãe que se preze precisa ensinar o filho de 4 meses a letra A, pelo menos, ou as cores, ou as formas, ou qualquer coisa que denote que seu filho é super dotado e a mãe portanto é uma excelente mãe, iniciou cedo, colheu os frutos ainda frescos.

Tem também a questão do desfralde, essa é simples, uma mãe perfeita desfralda até os 2 anos, mãe mais ou menos desfralda até os 3, uma péssima mãe desfralda até os 4, depois disso não pode ser considerada mãe, o mesmo se aplica ao desfralde noturno, com a ressalva de que a mãe top the best já realizou o desfralde noturno juntamente com o diurno, palmas.

Outro assunto recorrente e que gera polêmicas é o sono noturno, UAU, uma mãe boa mesmo consegue tirar da maternidade e já ensinar o bebê a dormir no seu quarto, na sua cama, por seguidas 8 horas. Não conseguiu? É o caso de conversar com um psiquiatra.

E seguem outros assuntos muito polêmicos, a rotina, as brincadeiras, os livros, a TV, os limites, o choro excessivo, e assim posso eu escrever uma extensa e importante lista de prioridades, necessidades e atributos que uma mãe perfeita necessita executar caso decida se aventurar nesse lugar chamado maternidade. Para quem é mãe, segue lendo, para quem não é, acredite parece difícil mas na prática e no atropelo do dia a dia nem percebemos isso tudo passando lentamente pelas nossas vidas, afinal, se não fora o esquecimento ninguém seguiria produzindo mais filhos depois do primeiro. Como diz minha mãe, "pai e mãe tem memória curta, Deus os fez assim para continuar as gerações."

Então que assim que engravidamos começamos a ser bombardeados por esses dados todos, iniciamos uma longa preparação para sermos as mães perfeitas do momento. Fico realmente tentando me recordar o quanto ignorei muito do que li e fico pensando na dificuldade que sentimos ao perceber, quando o bebê nasce, que a realidade é MUITO diferente daquela que líamos e que nos dizem ser a ideal.

No meu descobrir materno passei por muitas frustrações, foi difícil, chorei, desisti, voltei. Em conversa com a minha mãe, ainda na fase da amamentação ela me disse o seguinte: "porque você sofre tanto, não tem motivo, quando tive vocês todos eu só deixava a vida me levar, eu pensava que ia dar certo e dava, ouvia minha mãe, mas estava sozinha e fazia o que achava melhor."

Pá!

Foi assim em um estalo que eu me perguntei, porque sofro tanto? Por que?

Vamos conversar, meu parto não foi o que eu desejei, preparei tudo para que fosse parto normal com os bebês nascidos a termo, mesmo que o médico me dissesse que é muito complicado um parto normal de gêmeos eu me fiava no fato de que minha mãe teve gêmeas em sua primeira gestação e conseguiu fazer parto normal, estava na minha genética, eu também conseguiria. Mas veja bem, eu não consegui. Não porque eu não quisesse, não aconteceu porque não era para mim, fatores tinham todos, eu tenho redução de estômago, eles nasceram prematuros e ficamos 9 horas e meia em trabalho de parto, eles não teriam forças e eu sequer poderia exigir isso de dois bebês que estavam para nascer de 7 meses, sem sabermos ao certo como nasceriam e se estariam bem. Fiquei frustrada e por vezes perguntei ao médico se isso era tudo, e era. Aprendi a lidar com a situação, tive 5 segundos para lidar com o sofrimento levantar a cabeça e seguir para a cesariana que daria, chances de vida a eles e a alegria para mim de tê-los comigo. E foi assim que descobri que não importava o tipo de parto, importava que no final tudo desse certo. E deu!

Em seguida comecei a lidar com a amamentação, novamente estava certa de que tudo daria certo, que seria simples, é natural, SQN, eles nasceram prematuros, alguém anotou? E eles demoraram MUITO tempo, quase 30 dias para aprender a amamentar, foi dolorido, foi sofrido, no geral o leite desce em seguida ao parto, no meu caso tudo foi diferente, com o parto da forma que foi, com os dois nascidos ainda com dificuldades de respiração passei por um processo lOOOOOngo até o leite descer, mas desceu, eles mamaram, mas não foi bonito como vemos na televisão e não foi fácil como parece quando todos dizem. Dois bebês, menos leite para cada um, isso demandava que eles mamassem dia e noite em média a cada 1 hora, sono virou artigo de luxo e paciência também. Não desisti, simplesmente porque eu estava certa de que seria o melhor, e foi, mas não sem sofrimento, porque sim foi difícil e por muitas vezes desejei desistir. Eles não mamaram no peito o tanto quanto desejei, mas mamaram o tempo certo, a partir de um momento o meu leite era pouco e eles precisavam de mais, comecei a complementar com a fórmula, e eles estão bem, cresceram e estão VIVOS!

Assim que sai da maternidade, 30 dias depois deles nasceram, recebi visita de uma mãe de gêmeos que me disse assim, "nem se preocupe você vai cuidar deles sozinha, eu cuidei e foi muito tranquilo, nunca precisei de ajuda." Abençoada seja, eu me senti maluca quando fui percebendo aos poucos que eu precisava de ajuda e sempre me batia a frase dela me dizendo, NUNCA PRECISEI DE AJUDA. Eu precisei e me senti péssima por isso, mas tenho sorte porque tenho uma mãe que também passou por isso e ela sempre me disse não há erro em precisar de ajuda, melhor ter ajuda do que ficar maluca. ADORO minha mãe, ela sabe das coisas. Mais tarde descobri que não, a pessoinha não cuidava sozinha, ela também teve ajuda, e pensei rapidamente, mas não muito, PIMENTA NO DOS OUTROS É REFRESCO.

Depois dessas lutas todas muitas outras foram travadas, tive dias em que queria desistir de tudo e de todos, tive dias em que acreditava em mim e tive dias em que não acreditava nem que eu estava ali. Passei pelo processo de alimentação, eles já comeram bem, já comeram de tudo, hoje são seletivos, já sofri e já me senti péssima mãe, acreditando que fiz TUDO errado, mas hoje penso que não, eu fiz tudo o que tinha para ser feito, mas os filhos crescem e cada um deles tem seu tempo, algumas crianças vão ser saudáveis e desejarão comer frutas sempre e mais, outras não, aqui nos alimentamos com muitas frutas e legumes, como manda o figurino, não foi um hábito que aprendemos por eles, era algo que já tínhamos, porém eles comem muito pouco. Por outro lado tenho uma amiga que nada come de frutas e fica impressionada como o filho gosta de frutas, sendo que no caso dele é sim a principal alimentação, é lindo de ver, e ela segue não comendo frutas. Ops, vocês me dirão que isso é estranho pois a criança aprende pelo que vê, sim, eu sei disso e falo disso em pelo menos uma aula por semana, frisando a importância de expor a criança a situações em que ela veja os pais para que reproduza o hábito que ela visualizou. Devo ter problemas, como frutas, ofereço, como, compro e eles só gostam de banana. O que fazer? Compreender que para tudo há tempo, eles já comeram, um dia voltam a comer. Assim espero....

Não pensem que deixarei de sofrer, vez ou outra vou na pediatra e estou em desespero, ela me acalma e eu sigo a vida...

Bom, poderia ficar aqui listando todas as situações que vivenciei, nem todas foram exatamente como planejei, e descobri devagar que eles simplesmente não são como eu desejaria que fossem, eles são do jeito deles. Tem dias que são agitados demais para o meu gosto, e friso bem PARA O MEU GOSTO, e ai me pergunto mas como meu Deus, coloco eles a ouvir música clássica desde que nasceram, como pode isso? PODE!

Tem dias que eles não querem ler e nem me ouvir contar histórias e então eu penso, mas como meu Deus, eles tem uma mãe contadora de histórias que tem um zilhão de livros, que fala da importância de ler todos os dias e eles não aproveitam isso. Como pode? PODE!

Alguns dias eles ainda fazem xixi nas cueca e eu que desfraldei eles bem certinho, usando livros, penico, estimulação, começaram cedo, aprenderam com tranquilidade, como pode isso meu Deus? PODE!

E para constar, eu sou a mãe péssima que tem meninos de 3 anos que ainda usam fraldas para dormir, eu sei, nem deveria levar o título de mãe, mas por algum motivo eles insistem em me chamar assim =O

Pensando muito nisso tudo comecei a perceber aonde está o problema, temos hoje uma cultura massiva, sobretudo na internet, que dita como devemos ser mães, lemos outras mães mostrando seus feitos, mães comuns que se entendem no direito de dizer o que é certo e errado e que julgam sem perceber que cada uma de nós tem um caminho, SEU, a percorrer, e que a maternidade tem uma configuração diferente em cada criança que nasce. Ser mãe não é um seguimento do qual simplesmente temos regras e passos a seguir, como em um jogo de video game, ser mãe tem dias bons e dias ruins, tem facilidades e dificuldades. Nem todos terão o mesmo tempo, a mesma disposição, se passarmos a definir a nossa maternidade como a maternidade do outro passaremos a sofrer demasiado, porque ninguém é igual e NINGUÉM É PERFEITO. Cada uma de nós será assim a melhor mãe que seu filho precisa, no tempo daquela criança especificamente.

De tudo e de tanto, aos poucos, foi me batendo uma certeza, não há certo e errado, não há mãe boa, não há maternidade perfeita, somos aquilo que vamos nos construindo, somos aquela mãe que nossos filhos necessitam, acreditamos mesmo ensinar a eles tudo o que eles precisam saber, e não sabemos que de fato eles quem nos ensinam exatamente aquilo que eles precisam para crescer.



5 comentários:

  1. Carol querida. Obrigada por me marcar!

    Então, é impressionante a exigência que vem com a maternidade. Além das cobranças internas feitas por nós mesmas, tem as cobranças externas. Acho que toda mãe em algum momento pensa nessas coisas. Eu já me cobrei por não conseguir escovar os dentes do Pititico todos os dias, me cobrei por ter amamentado só 7 meses, me cobrei por não ter tido parto normal. Mas a gente vai aprendendo e eu comecei a ver as coisas de outra forma.

    Cada mãe é de um jeito, cada filho também. Cada família sabe o que funciona e o que não funciona em casa.

    Acho que nós é que temos que deixar de lado essa perfeição tão cobrada e levar a vida mais leve. Parar com essa de menos mãe, mais mãe.

    Beijo!

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  2. Perfeito amiga!!Perfeito!!Eu quase enlouqueci quando os meus nasceram e eu já era mãe...Mas aos poucos descobri que não são robôs nem cães e que não podemos adrestrá-los e sim educar,mas que terão suas vontades e seus desejos,seus tempos...Vc me ajudou muito na época!!E me ajuda até hj!!

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  3. Olá!
    Impossível não comentar após a leitura de um texto tão bacana, bem escrito, cheio de sentimentos e verdades preciosas...
    Ainda não sou mãe... nem comecei a tentar e já me cobro porque acho que estou passando da idade dita ideal...rsrsrsrs
    Vou levar suas palavras comigo quando for mãe...
    Muito obrigada...
    Uma abraço,
    Telma

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  4. Ai Carol..."filhos melhor não te-los,mas se não os temos como sabe-los?!"Para mim são um mistério,a maior e melhor loucura!Aqui em casa travamos quase uma batalha diária entre um quase bebê e uma adolescente...E a loucura maior é que só vale apena com eles!Um bj,graças a Deus não somos perfeitas!

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  5. Nossa, Carol... nem te conheço, mas te amei!
    Também não tive parto normal, também só amamentei até 1 ano de vida, também demorei para desfraldar... não tive gêmeos, mas tenho dois filhos com 1 ano e 9 meses de diferença, então precisei sim (e muitas vezes ainda preciso) da ajuda ma minha mãe, do meu pai, do meu marido... e nem fui pra cadeia por ser uma mãe tão terrível !!! rsrsrsrs
    Que bom que você descobriu isso... sabe, eu sou tão "na boa" com essas coisas... mas realmente, querem nos colocar numa caixinha, e temos que ser exatamente como a "moda" anda ditando. Não tenho nada contra quem busca o parto humanizado, a amamentação até os 2 anos ou mais, ou desfraldar com um ano de vida (esse último tenho mais ressalvas), mas... comigo não funciona assim, as pessoas são diferentes, os bebês são diferentes e devemos levar a vida da forma como somos e não da forma como querem nos enfiar guela abaixo.
    Sofri de ver o quanto você sofreu, e fiquei muito feliz de perceber que você pensa assim. Viva, curta, aproveite seus filhos de 3 anos de fraldas noturnas... eles não vão usar fraldas até os 30 anos, pode ficar tranquila kkkk logo logo não vão querer mais.
    E... o mais lindo disso tudo, é constatar nossa humanidade, nossa diferença, nossa humildade em assumir que nem tudo é como sonhamos, mas, é como deveria ser!
    Lindo, amei, curti, to contigo e não abro hahahahah


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    beijossss

    Dani

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